[Resenha] As Baianas - Carlos Barbosa, Elieser Cesar, Gustavo Rios, Lima Trindade, Mayrant Gallo e Tom Correia


Inspirado no livro “As cariocas” autoria de Sérgio Porto, obra que destaca a originalidade das mulheres do Rio de Janeiro. Em “As baianas”, essa originalidade se mantém e somos levados à um passeio pelos bairros da cidade de Salvador, apresentando aos seus leitores as diversas personalidades de mulheres soteropolitanas. O Livro de contos que nasce de uma brincadeira entre seis amigos escritores baianos, Carlos Barbosa, Elieser Cesar, Gustavo Rios, Lima Trindade, Mayrant Gallo e Tom Correia, nos revela mais uma vez o talento literário que vem da Bahia. Os contos e seus respectivos autores são:

Capa do Livro
Editora - Casarão do Verbo
A BONNIE DOS BARRIS – Mayrant Gallo
Ela chegou a passar o verão e, como um dardo incandescente, aninhou-se em seu peito. Ele pensou que fosse magia ou sonho, mas era amor: uma palavra que em muitos idiomas tem só duas sílabas; noutros, três: triângulo. Todavia, se houve um triângulo, foi com o mundo...

A GUERREIRA DA LAPINHA – Elieser Cesar

Quitéria se vestiu como a heroína da história para desfilar no Dois de Julho. Acordou cedo, tomou café requentado com um resto de biscoito amolecidos pelo mofo velho do armário, pôs um vestido verde com bordado amarelo à altura dos joelhos, uma calça amarela e um capacete de papelão, verde com um penacho amarelo. Como não tinha botas, calçou a velha galocha com a qual, nos dias de chuva, pisava no lamaçal que se formava na encosta em que morava. Passou um batom que não se sobressaia nos seus lábios grossos e ressecados e saiu para a Lapinha.

A SANTINHA DA RIBEIRA – Tom Correia

Abri a porta, ajeitei as coisas em cima da mesa e liguei a tevê. Coloquei a comida de Rebeca, mas ela não parecia animada. Eu já havia notado que ela emagrecera. Troquei de ração várias vezes sem resultado. Talvez estivesse grávida. O melhor de tudo era saber que eu seria um pai apenas adotivo, se fosse o caso, e não teria de levar gatinhos para a escola...

A PIRIGUETE DE ONDINA – Lima Trindade

Apreensão. Alta voltagem. Sarita, debruçada no parapeito da sacada do Othon, aguarda o seu negão. Promessa é dívida. Faltam apenas dois dias para o começo da folia. Ela nunca esteve no camarote de Daniela. Téo disse que dessa vez era quente, que Lúcia Pablo garantiu, entregaria as pulseirinhas coloridas no Jantar em homenagem ao governador do Estado.
A PUTINHA DA VITÓRIA – Carlos Barbosa
Não permaneci mais que cinco minutos no hotel, depois de chegar do Campo Santo. Era um dia vestido de saudades vivas, como na antiga canção. Um dia que pedia passos a memória, assovios em suas esquinas. Minhas roupas estavam tão amarrotadas quanto o meu espírito.

A NOIVINHA DO CABULA – Gustavo Rios
Vestia o branco reservado às noivas, branco que se refletia nas pegajosas retinas dos vizinhos. E aquele vestido roto ainda cheirava a naftalina e coisas mortas. Morto, sobre a cama de lençóis alvos. Morto, com os pulmões podres, o olhar de eterna renúncia.

Dividido em seis conto (listados acima), o livro vem apimentado, como vocês podem perceber pelos títulos, nos dando um vislumbre da literatura erótica presente na obra, que tem na Bahia um dos seus principais representes, o ilustre Jorge Amado. Cabe dizer que alguns do títulos, pra mim, soaram machistas, embora as histórias tratem de mulheres livres, que fazem o que querem, sem estar necessariamente presas às regras sociais impostas. Além do mais, em algumas vezes, os enredos nos lembram um pouco o livro “A vida como ela é” de Nelson Rodrigues, tanto pela narrativa quanto pelos vários temas que aborda. Eu poderia aqui, fazer uma análise conto a conto, mas acredito que isso tiraria a beleza da leitura para aqueles que se interessarem pelo livro, ao invés disso, trouxe apenas o início de cada uma das histórias, para atiçar um pouco mais a curiosidade de cada um de vocês.


Cabe destacar aqui a beleza nas descrições feitas da cidade Salvador, passando pelas mais variadas paisagens que são os bairros escolhidos para ambientação dos contos. Outro aspecto que é interessante ressaltar é a construção da escrita em cada texto, temos contos escritos por homens e dessa forma, o olhar masculino prevalece. Outro ponto que deixa a obra muito mais original é a linguagem empregada pelos seus autores, se tratando de uma obra ambientada na Bahia, claro que o “baianês” não poderia ficar de fora. Você irá se deparar com as expressões que são próprias de lá, “piriguete”, por exemplo, que hoje já é um termo já popular e utilizado em todas as regiões do Brasil, mas que teve a sua origem na capital baiana. Ademais, podemos encontrar também expressões como, “mas ela parece ‘PANCADA’(cilada)”, ‘Depois do casamento ‘GORADO’(fracassado)”, “foi aí que me ‘RETEI’ (fiquei bravo)” ou “no ESQUEMA’ (tá tudo bem)”. Esse jeitinho peculiar e criativo de falar, traz um tom informal ao texto e acrescentando um toque de humor aos contos.

Finalizando, temos em “As baianas” uma leitura divertida, na qual os autores buscaram, por meio de personagens intrigantes, falar um pouco sobre as relações humanas, sendo as histórias por diversas vezes imprevisíveis, nos causando espanto pelo seu desfecho inusitado. E tudo isso alinhado a uma escrita leve e gostosa que adiciona aos eventos narrados um pouquinho de dendê e da pimenta que só a Bahia tem.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

[Resenha] Diário de Bitita - Carolina Maria de Jesus

[Resenha] Casa de Alvenaria: diário de uma ex-favelada – Carolina Maria de Jesus

[Frase] - Poema "O colono e o fazendeiro" - Carolina Maria de Jesus