[Resenha] Casa de Alvenaria: diário de uma ex-favelada – Carolina Maria de Jesus
Capa do Livro (1961) |
Publicado em 1961, após o sucesso do seu primeiro livro (Quarto de despejo: diário de uma favelada), "Casa de alvenaria: diário de uma ex-favelada" é o segundo livro publicado pela escritora Carolina Maria de Jesus, nele, a escritora narra o seu dia a dia e a transformação da sua vida após o lançamento do seu best-seller.
Em linhas gerais, o livro mostra as percepções da autora sobre a nova vida. Nessa pequena análise, destacaremos alguns pontos que são relevantes na obra, mas que não extrapolam o conteúdo contidos nas páginas de "Casa de Alvenaria".
Após o lançamento do livro "Quarto de despejo" em 19 de agosto de 1960, a vida de Carolina e dos seus três filhos muda radicalmente, na primeira semana de lançamento vendeu 10 mil exemplares, algo nunca feito por outro autor (a) antes.
“O repórter desembrulhou os livros e deu-me um. Fiquei alegre olhando o livro e disse:- O que eu sempre invejei nos livros foi o nome do autor.E li o meu nome na capa do livro.Carolina Maria de Jesus.[...] Fiquei emocionada.[...] É preciso gostar de livros para sentir o que eu senti.” (p. 38).
A partir daí, Carolina Maria de Jesus entrou para a história. Saiu da favela do Canindé, numa saída um tanto tumultuada, pois, a exposição diária na mídia, o sensacionalismo a respeito das suas finanças, fez com que os moradores da favela se revoltassem contra ela, que ao sair com o caminhão que levava as suas coisas, recebeu uma chuva de pedras, chegando a ferir um dos seus filhos.
“Até que enfim deixo esse recanto maldito. Não vou incluir a saudade na minha bagagem”.
Novamente, a fome entra como tema da narrativa, dessa vez de forma mais branda, na qual, a escritora revela toda a sua satisfação por conseguir, graças a sua perseverança, colocar comida na mesa para os seus filhos, porém, sempre trazendo as recordações do seu tempo de catadora e as dificuldades que passou durante anos.
“Agora eu estou na sala de visita. O lugar que eu ambicionava viver. Vamos ver como é que vai ser a minha vida aqui na sala de visita.” (p. 48).
Cabe destacar aqui, a relação de amor ódio com o escritor Audálio Dantas. Ela tanto fala mal, como bem do “repórter”, como carinhosamente ela o chamava. Muitas vezes Carolina se revoltava com ele pelo excesso de proteção, na maioria das vezes, por ele criticar os seus gatos excessivos, ela afirma que ele não é o dono dela, que ela faz o que quiser da vida dela. E assim foi a relação deles, conturbada.
Outra coisa importante, e mais uma vez impulsionado pelas notícias que circulavam em todos os jornais, era a notícia de que ela ficara rica, com isso, várias pessoas apareceram querendo se aproveitar e tirar um pouco de vantagem dela. A respeito disso, no dia 9 de fevereiro de 1961, Carolina escreveu “Hoje ninguém veio pedir dinheiro. Graças a Deus!” (p. 137). Um pouco mais a frente, ainda falando sobre as pessoas que a procuravam, ela afirma:
“Agora que tenho dinheiro sou procurada igual um personagem em destaque. Transformei-me em abelha rainha de uma colmeia que não quer mel, quer dinheiro”. (p. 153).
Já acomodada na casa de alvenaria, Carolina começou a circular na alta sociedade, com o sucesso cada vez mais crescente do seu livro, começou a cada vez mais, receber convites para eventos. Dentro da nova realidade, Carolina passou a perceber que o meio em que estava inserida agora, se mostrava cada mais perverso e que viver por lá não seria o paraíso que ela imaginava.
“... Tem hora que eu fico pensando: na favela há brutalidade. Eram incultos. Aqui há rivalidades e ambição. Não há sinceridade.” (p. 103).
A crítica, presente em suas obras, aparecem em casa de alvenaria e sempre muito ácidas, críticas voltadas principalmente à sociedade, ao regime capitalista e ao cenário atual do Brasil na época. Como fez em um bate papo após a encenação da peça “Quarto de despejo” no Teatro Bela Vista:
“A terceira oradora fui eu. Citei: fui residir na favela por necessidade. Com o decorrer dos tempos percebi que podia sair daquele meio. Era horroroso pra mim presenciar as cenas rudes que desenrolava-se na favela como se fosse natural. (...) os favelados são os colonos (referência ao seu poema “O colono e o fazendeiro”). Por ser expoliados pelos patrões abandonaram o campo. Encontraram dificuldades na cidade, que só oferece conforto e decencia aos que tem bons empregos. Êles não podem acompanhar a vida atualmente. Devido ao custo de vida são obrigados a recorrer ao lixo ou restos de feira.” (p. 181).
E conclui:
“- Não adianta falar de fome com quem não passa fome” (p. 181).
Percebemos também a sua desaprovação aos modos da sociedade, ao se referir a um dos jantares que participou com as mulheres da alta sociedade, ela diz:
“As mulheres que estavam na minha mesa falavam em reforma social.[...] Eu pensava: Elas são filantropicas nas palavras. São falastronas. Papagaios noturnos. Quando avistam-me é que recordam que há favelas no Brasil.” (p. 97).
Relatando o seu cotidiano em diário, ela nos mostra as suas percepções sobre a vida nova. Aqui, ela vai apresentar ao leitor as diversas situações vividas, boas ou ruins, na tão sonhada casa de alvenaria. Diferente de "Quarto de despejo", a obra não teve boa recepção do público e não alcançou o sucesso esperado pelos seus editores. Talvez, as críticas tecidas à sociedade por uma Carolina ácida, não tenha agradado ao público, principalmente a classe média, por ver a sua face perversa refletida de forma tão reluzente nas palavras da escritora.
Sobre a autora:
Carolina Maria de Jesus - Foto retirada da internet |
Carolina Maria de Jesus nasceu na cidade de Sacramento em 14 de março de 1914. Bitita como era chamada pelos seus parentes, era uma criança diferente das crianças da época, pois a mesma, desde pequena era muito astuta e curiosa. Semianalfabeta, frequentou apenas dois anos da escola primária, período esse que despertou o seu gosto pela leitura. Passa boa parte da sua juventude em Sacramento em companhia da sua mãe. Anos depois, muda-se para São Paulo – SP, passa por várias situações difíceis na sua busca para se tonar uma escritora, sem sucesso, acaba indo morar na favela do Canindé, lá, escreve a sua obra mais famosa e com a ajuda do jornalista Audálio Dantas lança o seu primeiro livro – “Quarto de despejo: diário de uma favelada” (Leia a resenha aqui). Ainda em vida, consegue publicar outros livros, "Casa de Alvenaria: diário de uma ex-favelada", onde Carolina narra a sua vida pós-lançamento de "Quarto de despejo" e mais duas obras "Pedaços da fome" (romance, 1963) e "Provérbios" (1963). Outras obras póstumas foram publicadas, a mais famosa delas "Diário de Bitita", publicado primeiro na França em 1982 (Leia a resenha aqui). Carolina morreu em 13 de fevereiro de 1977 em decorrência do agravamento dos sintomas da asma, hoje é considerada um dos expoentes da Literatura Negra do Brasil.
Estou querendo comprar mas ainda não achei. Sabe me dizer onde consigo encontrar no RJ ou internet?
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